A greve do peão de Fortaleza se transformou num grande exemplo para os trabalhadores de todo o país. Se por um lado expôs a insensibilidade dos patrões, por outro mostrou a força da classe operária. Os trabalhadores enfrentam nas ruas a imprensa reacionária, a polícia e as empresas. O Opinião Socialista conversou com o diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Fortaleza, Francisco das Chagas Gonzaga, ou simplesmente Gonzaga, como é conhecido, que falou sobre a tradição de luta dos operários da construção civil de Fortaleza e de como ainda estão vivas as lembranças de outras greves, como a de 1995.
O que foi o estopim para a greve?
Gonzaga A greve desse ano já vinha sendo construída há algum tempo. Essa categoria tem uma tradição de luta muito grande. Em 2003 e 2004 fizemos greve contra o banco de horas. Há dois anos assinamos contrato coletivo sem greve e a própria categoria dizia: Tem que ter greve, nesse ano tem que ter greve, porque estamos perdendo. A partir disso começamos a preparar uma pauta de reivindicação, com seminários. Negociamos o mês de março inteirinho, desde o dia 29 de fevereiro.
Mas a patronal, depois de muita conversa, veio com essa proposta de 8%, que representa R$ 7 reais acima do mínimo de um servente. O reajuste de todos os pisos são todos menores que no ano passado. O trabalhador percebe que tudo vai aumentando. A cesta básica hoje em Fortaleza é uma das mais caras do Brasil. O trabalhador começa a ver isso: o feijão, o arroz, o pão… O salário começa a não dar mais.
Essa greve tem sido muito radicalizada. Por que isso ocorre?
Gonzaga Temos hoje uma categoria jovem, uma juventude muito grande. Então ela tem muita disposição de luta, muita garra, e também uma perspectiva de vida. Qual o jovem que trabalha hoje e ganha pouco não pensa em melhorar seu salário? Muitos têm ensino médio e tem na construção civil seu primeiro emprego, quer dizer, tem muita vida pela frente e não aceitam esse salário miserável.
Qual sua avaliação da greve até agora?
Gonzaga É muito positiva. Fazendo uma comparação com futebol, aqui temos o Horizonte, que pela primeira vez chega ao campeonato estadual. Então, não desprezamos a nossa força, mas a patronal nos menosprezava. Eles trabalham com a Justiça, a polícia, o governo, então, o patrão não acreditava muito que os trabalhadores fossem ganhos para essa proposta de luta. Hoje, depois de duas semanas, a disposição de luta continua com muita força. É até maior. Os trabalhadores percebem que por sua luta, através de sua força, é possível derrotar os patrões.
O peão constrói um hotel, um resort de luxo que nunca poderá usufruir. Ao mesmo tempo em que o setor cresce, os salários não aumentam. Esse foi um dos motivos para a radicalização da greve?
Gonzaga A origem do trabalhador da construção civil é o campo. Nós viemos do campo, da roça. O engenheiro, então, é o doutor. O mestre também. A gente costuma pensar que trabalhar é só receber ordens. Mas muitos trabalhadores moram na periferia e na favela, e quando ele entra numa luta em que sente a firmeza do conjunto, ele se fortalece. E é um trabalhador que não tem nada a perder, que sabe se virar. Sabe plantar, sabe colher feijão. Quando ele é desafiado, ele se fortalece. Fizemos uma greve em 95, com muita repressão, e que durou 20 dias úteis.
Não podíamos colocar o carro do sindicato pra fora que a polícia prendia. Arrumava qualquer motivo pra prender. Então, a história dessa categoria é de luta, de radicalização. A categoria diz hoje: se não tiver nada, vamos continuar que nem em 95. Porque boa parte dessa categoria era adolescente naquela época e os pais contavam como a gente fazia greve, como naquela época não tinha uniforme, não tinha água gelada nos canteiros, e que tudo isso foi conquistado através da greve.
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