Roberto Aguiar, de Salvador (BA)
Estudo realizado pelo instituto de pesquisas Plano CDE aponta que maiorias das pessoas das camadas mais pobres da sociedade tomaram empréstimos bancários para comprar comida e pagar as contas do dia a dia.
Quando questionados sobre por que tomaram ou tomariam um empréstimo, entre 45% e 50% dos entrevistados entre os mais pobres indicaram que a alimentação e as contas do mês foram ou seriam a principal finalidade.
Isso é reflexo da política econômica de Bolsonaro e de sua equipe ultraliberal, que durante quatro anos têm governado para os ricos, aprofundando uma política dos governos anteriores. Enquanto isso, os mais pobres sofrem com o aumento do preço dos alimentos e dos combustíveis, com a inflação acelerada e o corte das verbas públicas em programas sociais de combate à fome.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em agosto, a alta do preço dos alimentos já era o dobro da inflação em 2022. Produtos alimentícios subiram quase 10% em sete meses, prejudicando mais pobres, pois comprometem a maior parte de seu orçamento com alimentos e bebidas.
Enquanto a fome bate na porta dos mais pobres, o agronegócio brasileiro, que está hoje conectado com ao mercado mundial, lucra com a exportação, devido à alta do dólar. Somente no primeiro semestre deste ano, as exportações do agronegócio somaram 79,32 bilhões de dólares (alta de 29,4%), um valor recorde para o período.
Apenas no mês de junho, as vendas externas de carnes, segundo setor mais importante em exportações, foram de 2,35 bilhões de dólares, uma alta de 32,0%. Trata-se do maior valor mensal de toda a série histórica iniciada em janeiro de 1997. Enquanto isso, estamos pagando um preço absurdo pelo quilo da carne. Segundo o levantamento do Procon-SP, em convênio com o Dieese, mostra que o preço médio do quilo da carne bovina na Copa de Futebol de 2018 era de R$ 22,63. Hoje, o valor praticamente dobrou, está calculado em R$ 43,89.
Junto com o preço dos alimentos, vimos os preços dos combustíveis subirem, batendo recorde. Por trás dos reajustes abusivos está a política de preço de paridade de importação (PPI), criada por Temer (MDB) e mantida por Bolsonaro, que segue a cotação internacional do petróleo, a variação cambial e custos de importação, mesmo o Brasil sendo autossuficiente em petróleo.
Essa política só contribui para gerar lucros e ganhos recordes em dividendos a acionistas da Petrobrás e para deixar os brasileiros reféns da carestia. Pois, com o PPI, produzimos internamente em reais o petróleo que consumimos, mas pagamos os preços dolarizados ao adquirir os combustíveis. Isso é roubo!
Fome
O aumento dos preços dos alimentos e dos combustíveis, acompanhado de uma inflação galopante e de um desemprego crescente tem como resultado o aumento da fome. Em 2022, o Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 no Brasil apontou que 33,1 milhões de pessoas não têm garantido o que comer — o que representa 14 milhões de novos brasileiros em situação de fome. Conforme o estudo, mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau: leve, moderado ou grave.
Esse processo, agravado com a pandemia da Covid-19, foi acompanhado por um desmonte das políticas públicas volta às áreas sociais, por parte do governo federal, a exemplo da extinção do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Isso colocou o Brasil de volta no Mapa da Fome das Nações Unidas. Um país entra no Mapa da Fome quando mais de 2,5% da população enfrentam falta crônica de alimentos. No Brasil, a fome crônica atingiu agora 4,1%.
O rosto da fome em nosso país tem classe, gênero e raça. Pobre, negra e feminina. Dados da Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) apontam que existe fome em 11,1% dos domicílios chefiados por mulheres, e outros 15,9% enfrentam insegurança alimentar moderada.
Pela cor da pele, verifica-se que pessoas pretas ou pardas enfrentam insegurança alimentar grave em 10,7% dos domicílios. O percentual é de 7,5% em domicílios de pessoas de raça ou cor da pele branca.
O instituto destaca que a maior vulnerabilidade à fome por parte das mulheres, tem como dos elementos centrais, a desigualdade salarial e a menor inserção das mulheres no mercado de trabalho. Em média, as mulheres recebem, 20% a menos que os homens, de acordo com um estudo da consultoria IDados, com dados do IBGE. Essa diferença nos ganhos ocorre mesmo quando os dois gêneros ocupam o mesmo cargo, têm o mesmo nível de escolaridade e a mesma idade.
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Enfrentar os super-ricos para acabar com a fome
A fome foi um assunto que atravessou todo o processo eleitoral e segue sendo o tema em destaque na transição ao governo Lula-Alckmin. Bolsonaro dizia que ia manter o auxílio de R$ 600, inclusive reajuste para este valor até dezembro, em meio à disputa eleitoral. Lula também fez essa uma de suas pautas principais. Mas até que ponto esta medida de fato vai resolver o problema da fome?
Nós defendemos o auxílio de R$ 600, inclusive achamos que esse valor poderia ser pelo menos de um salário mínimo. Dinheiro tem, essa decisão é uma escolha política. Infelizmente, o que estamos vendo na transição ao governo Lula-Alckmin é um arremedo, um “armengue” político, em negociação com setores da direita, inclusive com o Centrão, em torno a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Bolsa Família.
O fato da proposta inserir o custo do Bolsa Família fora do teto tem gerado uma política e uma repulsa do mercado. Esperar o que do mesmo mercado que nunca se preocupou com as quase 700 mil vidas ceifadas pela Covid-19? Mas ao invés de se enfrentar com este mercado, Lula e sua equipe de transição buscam negociar, ceder e mostrar de que seu futuro governo tem compromisso com este mercado.
Não tem como governar para o mercado e para os trabalhadores e o povo pobre ao mesmo tempo. Esse filme nós já vimos nos 14 anos de governo PT. O final desta história deu Bolsonaro como resultado.
Para garantir comida no prato dos brasileiros é preciso atacar os super-ricos, enfrentar o mercado e o agronegócio. Se não for assim, a desigualdade social só vai aumentar. Programa emergencial de transferência de renda, como o Bolsa Família, é necessário. Mas só isso não resolve o problema da fome, do desemprego e da miséria. Isso só se faz com emprego e renda. E só é possível acabar com o desemprego e garantir salário digno a todos justamente tirando dos super-ricos.
É preciso reduzir a jornada de trabalho sem diminuir os salários. Pôr em marcha um plano de obras públicas a fim de absorver a reserva de mão de obra sem emprego (e atacar os problemas estruturais como o saneamento). Proibir as grandes empresas de demitirem e estatizar, sem indenização, as que insistirem em dispensar trabalhador. Além de aumentar os salários.
É necessário revogar as reformas trabalhista e da Previdência. Taxar os super-ricos e as grandes fortunas. Parar o pagamento da dívida pública aos grandes banqueiros e impedir as remessas de lucros. Estatizar as grandes multinacionais que controlam 70% da economia e colocá-las sob direção operária para atuarem de acordo com os interesses da população.
Assim como, deve-se colocar a Petrobras sob controle dos trabalhadores, retomando as ações que estão hoje nas mãos de megainvestidores estrangeiros, e colocando-a para produzir combustível e gás a preço de custo. Reestatizar as empresas privatizadas, como a Vale e a Eletrobras.
Realizar reforma agrária, garantindo terras cultiváveis e financiamento aos pequenos agricultores, que cultivam alimentos com qualidade ao nosso povo.
Ou seja, para acabar com a fome é necessário enfrentar o grande capital, os super-ricos e os bilionários. O futuro governo Lula-Alckmin estará de que lado? Pelo programa que defenderam durantes as eleições, com a composição da equipe de transição e com as alianças que estão construindo, inclusive com o corrupto Centrão, caminham para um governo dos ricos.
A nós, cabe a tarefa de manter a nossa independência política e organizar a luta em defesa das pautas históricas da classe trabalhadora, construindo a unidade de ação nas lutas, e seguir a batalha pela construção de uma alternativa socialista.
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