Redação

Renata França e Gabriela Vasconcelos, de São Paulo (SP)

Em 19 de agosto de 1983, lésbicas que distribuíam o Chanacomchana, jornal publicado pelo Grupo Ação Lésbica Feminista (Galf), resistiram à violenta tentativa de expulsão do Ferro’s Bar, no bairro do Bixiga, em São Paulo. Elas ocuparam o local e protestaram contra a repressão policial e a ditadura militar.

O levante foi um marco para o orgulho lésbico e fez de agosto o mês da nossa visibilidade. Em 29 de agosto de 1996, o 1º Seminário Nacional de Lésbicas transformou a data em Dia da Visibilidade Lésbica e Bissexual.

Hoje, diante da pandemia e da catástrofe econômica na qual vivemos, queremos homenagear e resgatar o espírito combativo das lutadoras do Ferro’s Bar, contando a história das lésbicas e bissexuais (LBs) que lutam todos os dias contra a invisibilidade, a lesbofobia e a bifobia.

Precarizadas, na informalidade e demitidas

A lesbofobia e a bifobia já nos empurravam para a informalidade e o subemprego antes da pandemia. Com o aprofundamento da crise, o abismo social entre os homens brancos e heterossexuais e as mulheres negras e lésbicas aumentou.

“Ser negra e lésbica nessa sociedade é encontrar muitas portas fechadas quando se procura emprego nas ditas ‘boas empresas’. É ser previamente desqualificada e, por conta disso, ter que ficar provando o tempo todo que você é boa no que faz, pois sua capacidade é sempre colocada em xeque”, relata Rosirene Soares, aposentada do sistema judiciário, no Rio de Janeiro.

Invisíveis às políticas de emprego e renda, as LBs estão sendo demitidas em massa ou tiveram uma brutal queda de renda durante a pandemia. Pesquisa realizada pelo “votelgbt+”, com 10 mil LGBTIs (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexos), constatou que uma em cada quatro pessoas da comunidade perdeu o emprego. As que continuam trabalhando estão nas áreas mais expostas ao contágio, como entregadoras de aplicativo, telemarketing e nas áreas de saúde e limpeza.

O isolamento social e a pandemia da violência física e psíquica

Muitas LBs foram expulsas de casa ou vivem sozinhas para se preservarem do ambiente de opressão familiar. Nesses casos, o isolamento as afastou dos amigos e das redes de apoio. A pesquisa já mencionada mostra que 45% das lésbicas e bissexuais têm depressão, índice quase oito vezes maior que na população em geral.

O desemprego, a perda de renda e o maior convívio em casa com familiares levam a uma situação de maior vulnerabilidade psicológica e à possibilidade de violência, como conta Sabrina Abreu do Rebeldia – Juventude da Revolução Socialista, do Rio de Janeiro: “com o isolamento social, muitas são obrigadas a conviver diariamente com seus agressores, e é ainda pior se você for moradora de favela, onde a lei não chega, assim como outros direitos aos quais a mulher negra e periférica não tem acesso.”

Invisibilizadas na nossa sexualidade, somos objetos de fetiche e ódio

Lésbicas e bi são sexualizadas pela indústria da pornografia, mas hostilizadas e violentadas na vida cotidiana. Muitas de nós já sofreram o chamado estupro corretivo, em que o agressor quer “corrigir” a orientação sexual da vítima violentando-a!

Essa dupla moral é fruto da combinação do machismo com a lesbofia e a bifobia, que nos transforma em produtos da indústria do sexo para o prazer masculino.

Candidatas rompem a invisibilidade, denunciando a LGBTfobia e o capitalismo

Nestas eleições, muitos candidatos vão querer falar em nome das LGBTIs. Segundo dados da Associação Brasileira de LGBTIs (ABGLT), em 2020, comparando-se com as últimas eleições, haverá o dobro de candidaturas LGBTIs.

Contudo, para derrotar o conservadorismo lgbtfóbico nas câmaras municipais e nas prefeituras, não basta eleger LGBTIs. Danielle Bornia, pré-candidata do PSTU à prefeitura de Niterói (RJ), defende: “Não é o empoderamento individual de uma candidata nem o pink money de famosos que vão acabar com essa sociedade lesbofóbica. A força mundial das manifestações dos EUA contra a violência policial racista demonstra que é nas lutas, ao lado dos trabalhadores e de outros setores oprimidos, que conquistaremos as mudanças necessárias.”

Trata-se de algo ainda mais verdadeiro quando lembramos que estas eleições têm, como pano de fundo, um governo federal fundamentalista e genocida. Janaine Ferreira, pré-candidata do PSTU à prefeitura de São João Del Rey (MG), lembra: “Quando Bolsonaro diz que ‘usar mascara é coisa de viado’, debocha das LGBTs para dividir nossa classe pelo preconceito e impor sua política genocida. O descaso frente às mais de 100 mil mortes pela COVID-19 é o mesmo descaso com o qual estes senhores tratam a violência contra as LBs. Para os prefeitos e governadores, que são cúmplices de Bolsonaro, as vidas LGBTIs não valem mais que o lucro dos patrões. Por isso, aqui em Minas, é ‘Fora Bolsonaro, Zema e Nivaldo!’.”

Essa situação só nos coloca uma saída: “O capitalismo se aproveita das desigualdades de identidade de gênero e orientação sexual para intensificar a exploração de toda a classe trabalhadora e submeter as LBs a uma verdadeira barbárie social. Para explodir os armários do preconceito, é necessário unir a classe trabalhadora em toda a sua diversidade. Para acabar com a lesbofobia precisamos revolucionar este sistema de exploração e opressão. É preciso fazer uma revolução socialista”, diz a Professora Flávia, pré-candidata a vereadora pelo PSTU de São Paulo (SP).