Em menos de 48h vimos desmanchar-se no ar o golpe militar contra o presidente Hugo Chávez da Venezuela, protagonizado pela Fedecámaras, a federação dos empresários, a burocracia da Petróleos de Venezuela (PDVSA), estatal petroleira, por setores pró-imperialistas das Forças Armadas e pela pelega Central dos Trabalhadores Venezuelanos (CTV).
A derrota do golpe foi protagonizada por uma verdadeira insurreição popular acompanhada por uma espetacular divisão das forças armadas – que tomou as ruas de Caracas e de outras importantes cidades da Venezuela, como Maracay.
O IMPERIALISMO NORTE-AMERICANO PATROCINOU O GOLPE MILITAR NA VENEZUELA
Para nós não há dúvidas: na madrugada de 11 para 12 de abril houve um golpe militar na Venezuela. Um lock out (uma paralisação patronal), articulado com a CTV, foi o cenário armado para justificar o golpe, preparado previamente. Inclusive, o assassinato de 15 manifestantes por franco atiradores tem todo o perfil de um ~script~ armado para justificar o golpe.
O golpe colocou no poder um rosto civil: um autêntico Fujimori venezuelano: O mega-empresário pró-imperialista Pedro Carmona. Carmona mal assumiu o governo dissolveu a Assembléia Nacional e a Suprema Corte, destituiu todos os poderes eleitos em nível de estados e municípios, prendeu Hugo Chaves, perseguiu opositores e ameaçou de prisão todos deputados eleitos que não rezam da sua Cartilha. Segundo o jornal argentino Página 12, militares golpistas invadiram casas, realizaram prisões, e mataram pelo menos 34 pessoas.
Os EUA estiveram por trás do golpe e ainda tiveram o cinismo de apresentar ao mundo a versão de que o que ocorreu na Venezuela foi uma legítima ação civil para restaurar a democracia. Mas, como declarou à imprensa o professor e analista norte americano Michael Klare, que investigou o apoio da Casa Branca ao golpe de Pinochet no Chile: A derrubada do governo de Hugo Chávez na Venezuela é similar ao golpe dado contra Salvador Allende no Chile e é difícil não chegar à conclusão de que os Estados Unidos não tenham jogado um papel nisso. Os esforços para derrubar Chávez me parecem assustadoramente conhecidos.
Num momento em que o governo imperialista de Bush desata uma verdadeira guerra contra os povos, apoiando a ofensiva nazista de Israel na Palestina, prometendo invadir o Iraque depois de ter devastado o Afeganistão para roubar o petróleo dos árabes; em que ao mesmo tempo saqueia a América Latina jogando na miséria países inteiros em proveito das multinacionais como fez na Argentina; quando vai estendendo seus tentáculos militares por todo o globo a qualquer pretexto, como o faz com o Plano Colômbia; o golpe militar na Venezuela é mais um lance para fazer valer seus interesses econômicos, políticos e militares.
A Venezuela é o terceiro maior fornecedor de petróleo para os Estados Unidos e o vice presidente americano, Dick Cheney, em um documento intitulado Estratégia Energética Nacional, disse explicitamente no ano passado que os EUA queriam investir mais no petróleo Venezuelano e que estava exigindo que esse país elevasse sua produção.
Até uma criança sabe que a investida de Bush no Oriente Médio eleva o preço do petróleo e que a Venezuela, ao dirigir a OPEP, junto com os demais países produtores, controla a produção e o preço do mesmo. Num momento em que investe militarmente contra os países do Oriente Médio, é crucial para Bush ter sob seu total controle um país petrolífero capaz de abastecê-lo bem na sua vizinhança. E como o governo de Chávez não era de sua inteira confiança, Washington patrocinou e comemorou o golpe.
Não é à toa que o FMI foi o primeiro organismo internacional a reconhecer e prometer ajuda a Pedro Carmona. E não é à toa que o porta voz do Departamento de Estado Americano apressou-se em soltar um comunicado reconhecendo a autoridade do novo governo da Venezuela. A CIA, já desde muitos meses, tinha se manifestado preocupada com a Venezuela.
A participação do imperialismo norte-americano nesta tentativa golpista ficou ainda mais evidente depois de seu fracasso. O próprio New York Times publicou que altos funcionários do governo George W. Bush se reuniram várias vezes nos meses recentes com os principais dirigentes do golpe, dentre eles, o próprio Carmona.
AS MASSAS DERROTARAM O GOLPE MILITAR NAS RUAS
Ainda era manhã de sábado, 13 de abril, quando os trabalhadores e o povo pobre de Caracas desceram os morros e favelas que cercam a cidade. Aos milhares concentraram-se em frente ao Palácio Miraflores, saquearam lojas e supermercados, cortaram estradas com queima de pneus, como a que liga o centro de Carecas ao subúrbio Guaremas. Calcula-se que morreram mais de 40 pessoas nos conflitos. Os saques continuaram na madrugada de domingo para segunda.
As TVs e as rádios do país não noticiavam nada sobre as mobilizações contra o golpe e, em sua maioria, dedicaram-se a transmitir telenovelas e programas de entretenimento. Gustavo Cisneros, dono da Venevisión, a principal rede de TV do país, foi um dos artífices do golpe. A Agência de Informação Nacional Cubana (AIN) e a CCN eram as únicas fontes de informação sobre os protestos.
Na medida em que avançava a insurreição popular, as Forças Armadas se dividiam. Por volta das 16h, a divisão 42, da base de pára-quedistas de Maracay se declara insurgente. A unidade do Exército da cidade faz o mesmo. O fiscal geral das Forças Armadas, coronel Ricardo Reys, leal a Hugo Chávez, afirmou horas depois que 17 das 23 guarnições do país estão conosco.
Segundo o Jornal mexicano La Jornada, nas primeiras horas da tarde de sábado, um comandante leal a Chávez chamou pelo telefone ao oficial responsável pela custódia do presidente na base de Orchila:
Escuta irmão e disse a seu companheiro de armas tu sabes a tragédia que pode ocorrer neste país se vocês levarem Chávez? Vai ser terrível. Aqui há um milhão de pessoas nas ruas.
De distintas bases militares falavam oficiais de todas as patentes. Durante uma hora buscaram convencer os encarregados de Orchila para que impedissem a última opção que havia restado aos golpistas tirar o presidente do país uma vez perdido o controle do Palácio Miraflores, da maioria dos destacamentos militares e, principalmente, das ruas, invadidas nesta hora por centenas de milhares de pessoas que se mobilizavam contra o golpe.
Às 14h40, depois de suspender a nomeação dos novos ministros e sob a ameaça de que o Palácio Miraflores seria bombardeado, Pedro Carmona deixou o palácio rumo ao Forte Tiuna, sede do ministério da defesa, onde ficaria a salvo junto com os militares golpistas. Às 21h46, o presidente da Assembléia Nacional tomou o juramento do vice-presidente Diosdado Cabello, que tomou posse interinamente, até que Chávez reaparecesse. No Forte Tiuna, minutos depois, Carmona renunciava. Por volta faz 3h30 da madrugada de domingo, Hugo Chávez estava de volta a Miraflores e às 4h35 se dirigiu à população de todo o país em rede nacional de rádio e televisão. Terminava o golpe militar.
CHAVES DEVE ROMPER COM O FMI E NÃO PAGAR A DÍVIDA EXTERNA!
NÃO À RECONCILIAÇÃO NACIONAL COM OS GOLPISTAS!
O PSTU saúda a insurreição que derrotou o golpe militar como uma grande vitória do movimento de massas não só venezuelano, mas de toda a América Latina. Foi a espontânea mobilização das massas que derrotou o golpe e não um contra golpe palaciano. Foi o levante das massas que fez com que a divisão das Forças Armadas desse um salto, levando a insubordinação de soldados, suboficiais e de parte da oficialidade, e obrigando os golpistas a recolocarem Hugo Chávez no poder para evitar uma tragédia.
Mas mal reassumia o governo, Hugo Chávez, ao invés de prender todos os oficiais e os setores da burguesia golpista, submetê-los a um tribunal popular e expropriar todos os seus bens, propôs o estabelecimento de uma mesa de diálogo com os setores golpistas e fez um chamado à reconciliação nacional.
A resposta dos golpistas não poderia ser diferente. Quando o presidente perde perdão, tem que renunciar, para que esse pedido seja crível, declarou o deputado Pastor Heydra, da Ação Democrática (AD). Para Pedro Carmona a Venezuela está fraturada, e está fraturada profundamente. A grande burguesia pró-imperialista venezuelana consciente de seus interesses de classe, ao rejeitar a proposta de conciliação nacional, deixa claro que não hesitará em protagonizar outro golpe.
Da mesma forma que Allende, no Chile, meses antes do triunfo golpista de Pinochet, Chaves chama os trabalhadores e o povo a depositarem toda a sua confiança nas instituições do Estado Burguês, em particular nas Forças Armadas. A política de diálogo e reconciliação de Chaves só facilitará o caminho para um novo golpe militar mais bem preparado e articulado.
Não nos esqueçamos que foi o próprio Allende que nomeou Pinochet para ministro da defesa. Não nos esqueçamos que foi Allende que convenceu os operários chilenos a entregarem suas armas e a desocuparem as fábricas dos cordões industriais para que confiassem que as forças armadas preservariam as “instituições democráticas“. O resultado desta política todos nós conhecemos.
Chaves salvou o regime democrático burguês venezuelano reformando suas instituições e preservando a coluna vertebral das forças armadas. Mais que isso: é um governo com fortes traços bonapartistas, que não hesita em utilizar-se de medidas repressivas contra o movimento operário e popular e sua livre organização política e sindical, o que facilitou que a burguesia e a burocracia corrupta da CTV ganhasse uma parte da classe trabalhadora para a oposição de direita.
Por outro lado, com a derrota do golpe e apoiado na mobilização popular, Chávez teria todas as condições de avançar em medidas contra o imperialismo e a grande burguesia para atender as reivindicações e necessidades dos trabalhadores e do povo pobre da Venezuela.
Seria o momento de romper com o FMI e deixar de pagar a dívida externa. Seria o momento de expropriar os grandes grupos econômicos norte-americanos com presença no país. Seria o momento de estatizar todas as empresas privadas do pólo petroquímico. De varrer a burocracia corrupta da PDVSA e impor o controle democrático dos trabalhadores sob a empresa, através da eleição de todos os cargos de direção e revogabilidade a qualquer momento. Seria o momento de expropriar os grandes meios de comunicação privados do país. Enfim, Seria o momento de convocar todos os trabalhadores e povos latino-americanos a se levantarem contra a ALCA.
Mas Chávez se nega a tomar qualquer uma destas medidas. E sinaliza, inclusive, em recuar de vários itens do pacote de 49 leis aprovado por decreto no final do ano passado, que havia, por exemplo, limitado a participação do capital estrangeiro no país, aumentava impostos e royalties que as petroleiras estrangeiras deveria pagar ao governo, permitia a expropriação de latifúndios improdutivos acima de cinco mil hectares e subsídios aos trabalhadores rurais. Chávez busca a todo o custo retomar a confiança da burguesia, que considerou estas tímidas medidas como estatizantes.
Os trabalhadores e o povo da Venezuela demonstraram sua força com a derrubada do golpe militar. Por isso, devem confiar apenas na sua ação de massas e organização independente, em alternativa aos sindicatos pelegos e à Central dos Trabalhadores Venezuelanos (CTV) que apoiaram o golpe. Ao invés de esperar que Chávez resolva todos seus problemas, os trabalhadores e o povo da Venezuela devem seguir o exemplo de seus irmãos argentinos e organizarem assembléias populares onde se discutam os principais problemas do país, os meios para resolvê-los e tomem em suas mãos o seu próprio destino.
·Chávez deve romper com o FMI e não pagar a Dívida Externa!
·Expropriação dos grandes grupos econômicos norte-americanos instalados no País!
·Nenhum diálogo com os golpistas!Não à proposta de reconciliação nacional de Chávez!
·Prisão de todos os militares e burgueses golpistas e expropriação de seus bens!
·Estatização de todas as empresas privadas do póle petroquímico e dos meios de comunicação do país!
·Eleições de todos os cargos de direção da PDVSA com mandatos revogáveis a qualquer momento pelos trabalhadores da empresa!
·Em defesa da Organização Independente e Combativa dos Trabalhadores Venezuelanos!
·Fora o Imperialismo da América Latina! Retirada das Bases Militares Ianques da Venezuela e de todo continente!
São Paulo, 19 de abril de 2002.