Belém (PA), 08.08.2023 - Presidente Lula participa da reunião dos Chefes de Estado e de Governo dos países signatários do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), em Belém (PA). Foto: Ricardo Stuckert/PR Foto: Ricardo Stuckert/PR
PSTU-PA

Cerca de 30 mil pessoas participaram dos Diálogos Amazônicos, em Belém do Pará, nos dias 4, 5 e 6 de agosto. O evento antecedeu a Cúpula Amazônica que ocorreria nos dias 8 e 9, e contou com a presença de representantes de movimentos populares, organizações indígenas, movimentos de quilombolas, ribeirinhos, pesquisadores e ativistas que discutiram os problemas mais sentidos na região que engloba a Amazônia.

Ao final do evento redigiram a “Carta dos Povos da Terra”, entregue aos chefes de Estado após a Marcha dos Povos da Terra pela Amazônia, que reuniu cerca de 5 mil pessoas no dia 8. Entre as reivindicações mais urgentes está a necessidade de demarcação das terras indígenas, a promoção da Reforma Agrária Popular para acabar com a fome, a proclamação pelos governantes de estado de emergência climática na região, e o posicionamento favorável à participação política dos povos dos territórios nas decisões relativas à região.

Havia uma grande expectativa por parte dos participantes de que, pelo menos, parte de suas reivindicações fossem contempladas nos debates entre os oito presidentes de países amazônicos. Porém, a “Carta de Belém”, documento lançado ao final da Cúpula Amazônica foi um banho de água fria, e o sentimento geral foi de desapontamento. Nenhuma proposta concreta foi apresentada e a Carta de Belém foi alvo de críticas dos Indígenas, movimentos socioambientais e até do ator e ativista norte-americano Mark Ruffalo, cabo eleitoral entusiasta de Lula nas últimas eleições.

O que os diálogos exigiram e a cúpula ignorou?

No início dos Diálogos Amazônicos, o governador Helder Barbalho (MDB), o prefeito de Belém, Edmilson Rodrigues (PSOL), bem como o Governo Federal prometiam fazer um evento onde a voz dos povos seria ouvida: “Não é mais aceitável que falem da Amazônia sem os amazônidas. Nós não somos uma região sem gente, são 30 milhões de seres humanos vivendo aqui. Viva as vozes amazônidas que aqui vão se expressar em sua diversidade”, disse o prefeito na abertura do evento. Já a fala do governador dizia: “A partir do ‘Diálogos Amazônicos’ chamamos a todos aqueles que debatem a Amazônia e falam sobre nós para que possam, com os pés no chão, ouvir as vozes do nosso povo, conhecer um povo lutador e que deseja ser escutado na construção de uma sociedade melhor”. E o Governo Federal: O governo federal entende a participação social como um elemento central para a promoção do desenvolvimento sustentável e integrado das diversas Amazônias, com inclusão social, responsabilidade e justiça climática”.

No entanto, o que se viu na Cúpula foi apenas conversa e muita dificuldade para apresentar uma carta consensual que, no final, não trouxe nada de concreto, o que expressa a real falta de interesse dos governantes e instituições do Estado burguês em resolver os problemas da região amazônica.

A Carta dos Povos da Terra pela Amazônia tem como lema Nada sobre nós sem nós” e, em sua introdução, exigiu que os governantes proclamassem estado de emergência climática na região, protegendo 80% de seu território até 2025 para evitar o ponto de não retorno, e promover um plano de transição energética justo, popular e inclusivo. Porém, o que saiu da Cúpula foi uma resolução genérica sem sequer um acordo comum sobre metas de desmatamento. A exploração do petróleo na região sequer foi debatida a fundo, uma vez que países como a Bolívia estão com a política de expansão na exploração de combustíveis fósseis em seu território e, segundo Lula, o brasileiro pode continuar sonhando com a possibilidade da exploração de petróleo na margem equatorial da Amazônia brasileira, pois ele também continua sonhando.

Em seu ponto 2, a Carta dos Povos defendeu que a Cúpula se tornasse Titular 100% das reivindicações territoriais dos povos indígenas, dos afrodescendentes, quilombolas e das comunidades tradicionais, assegurando a segurança global (jurídica e física) da propriedade coletiva dos territórios indígenas, o respeito e a proteção territorial dos povos indígenas isolados e a garantia de uma perspectiva de gênero na distribuição e titulação das terras”. Mas a Cúpula sequer tratou da questão do Marco Temporal, principal ataque aos indígenas brasileiros e prioridade na sua agenda de lutas.

Uma outra reivindicação foi o fim da expansão do desmatamento para o agronegócio com punição aos responsáveis e fortalecimento da transição agroecológica na região. Porém, a Cúpula apenas se propõe a promover tecnologias e estratégias que garantam sistemas agroflorestais ligados ao manejo florestal sustentável, incluindo a agricultura familiar ou camponesa. Outro ponto fundamental apresentado pela Carta dos Povos foi a defesa de uma redução anual do uso de mercúrio nas mineradoras, o fim imediato da mineração ilegal e uma política de transição para o fim da mineração na Amazônia. Mas na Carta de Belém há apenas a proposta de monitoramento dos níveis desse metal que polui os rios e intoxica ribeirinhos e indígenas. Quanto à educação, foi exigido “assegurar o acesso a uma educação que oriente para a defesa dos direitos dos povos em seus territórios e da natureza, fortalecendo a educação bilingue e intercultural”, mas, infelizmente o que se viu no Brasil foi o governo Lula, a poucos dias da Cúpula, cortar 332 milhões da educação principalmente no ensino básico, alfabetização infantil e bolsas de estudo.

As disparidades entre os anseios e expectativas dos povos da Amazônia e os planos de seus líderes saltam aos olhos. E servem para demonstrar, mais uma vez, que esses governos, seja em qualquer país, não atuam para resolver os grandes problemas da classe trabalhadora, e tampouco os de seus povos originários atacados pela ganância cada vez mais criminosa dos grandes capitalistas em seus territórios e em suas tradições. Pelo contrário, eles defendem justamente os interesses desses capitalistas.