No dia 3 de outubro, a greve unificada dos trabalhadores e trabalhadoras do Metrô, da CPTM (trens) e da Sabesp (água e esgoto) parou a cidade de São Paulo. A mobilização foi uma resposta ao plano de privatização desses serviços pelo governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos). O movimento se combinou com a forte greve na USP que ocorre desde o último dia 18, paralisando estudante e trabalhadores (leia mais aqui).
A paralisação destes setores se integrou ao Dia Nacional de Luta em Defesa das Estatais e dos Serviços Públicos e, em São Paulo, foi construída a partir de uma campanha unitária, que envolve a realização de um plebiscito popular contra as privatizações para discutir e organizar, pela base, a resistência da população trabalhadora, nos bairros, escolas e nos locais de trabalho.
A greve obrigou o governador a decretar ponto facultativo, cancelar atendimentos em órgãos públicos e suspender as aulas. Tarcísio de Freitas buscou, ainda, criminalizar a greve, com a ajuda da imprensa e do Judiciário.
O governador bolsonarista agitou que “a greve era política” e não por reajuste salarial, por isso, seria uma greve ilegal. Mas, toda greve é política; como também é política a ação do governador de privatizar empresas públicas, sem consultar a população e os trabalhadores dessas empresas.
A conciliação de classes é um obstáculo na luta contra as privatizações
Tarcísio também queria dizer que greve tinha motivos eleitorais, buscando fortalecer o candidato de direita que ele vai apoiar, e, ao mesmo tempo, polemizar com Guilherme Boulos, do PSOL, que é pré-candidato por uma Frente Ampla, com apoio do PT e setores da burguesia, como o de Lula.
Não! Os trabalhadores não estão contra as privatizações por motivos eleitorais. Inclusive, também estão contra as privatizações de Lula, como nos metrôs de Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre. Na população, Tarcísio não ganhou pontos com esse discurso mentiroso. Mas ele queria unir o “mercado” em torno a si, sendo firme na postura pró-privatização.
A maioria da população apoiou a greve
Tarcísio e a imprensa tentaram jogar a população contra a greve, mas não funcionou. As trabalhadoras e trabalhadores, assim como a juventude, que usam o metrô e o trens, sabem o sufoco que tem que encarar diariamente. Assim como também sentem no bolso o preço alto da tarifa por serviços que deveriam ser muitíssimo melhores.
A privatização foi defendida por Tarcísio como modelo de qualidade, inclusive na coletiva de imprensa na qual criminalizou a greve e chegou a afirmar que apenas as linhas privadas estariam operando, o que, segundo ele, demonstrava a eficiência da privatização.
Mas a realidade falou mais alto e, logo em seguida, a Linha 9 – Esmeralda teve uma falha no sistema elétrico, paralisando o serviço até o dia seguinte e criando um caos que enfureceu os usuários. A linha, que é operada pela empresa Via Mobilidade, foi a que apresentou o maior número de falhas este ano, dentre todas as linhas: 23 panes ou problemas.
Desde janeiro de 2023, as quatro linhas de trem e metrô operadas pela iniciativa privada na capital paulista registraram 42 falhas.
— Linha 4-Amarela, da Via Quatro: 5 falhas;
— Linha 5-Lilás, da ViaMobilidade: 7 falhas;
— Linha 8-Diamante, da Via Mobilidade: 7 falhas;
— Linha 9-Esmeralda, da Via Mobilidade: 23 falhas.
Estender a luta para todo o Brasil
O exemplo de campanha, luta e de unidade de ação contra as privatizações construídas em São Paulo, bem como a iniciativa do plebiscito, deve ser estendido para os demais estados.
Uma necessidade imposta pelo fato de que a política de privatizações é parte do projeto de recolonização do Brasil e, hoje, é executado por todos os governos estaduais, sejam os de direita ou aqueles que se dizem de esquerda, a exemplo do governo do PT na Bahia. E no marco dessa unificação, é preciso também se enfrentar com as privatizações e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) do governo Lula.
Polêmica
Embora Tarcísio tenha tentado polarizar politicamente a greve com Boulos, a fim de enfraquecer o movimento e tachá-lo de “eleitoral”, o pré-candidato do PSOL não se posicionou a favor dos grevistas no decorrer do dia 3. Nas redes sociais, se limitou a cobrar do governador mais diálogo com os grevistas. Essa postura do pré-candidato do PSOL tem como objetivo não passar uma imagem de “radical” e, sim, de compromisso com a burguesia.
Isso ocorre porque, infelizmente, uma parte da direção do movimento, inclusive a direção majoritária do PSOL, não quer enfrentar as privatizações do governo federal e dos governos estaduais do PT, como é necessário.
Panorama
A greve foi forte nos quatro cantos da maior metrópole do país
Ainda era madrugada quando os trabalhadores do Metrô e dos trens iniciaram os piquetes da greve, que contou com 100% de adesão dos trabalhadores e trabalhadoras. Todas as linhas de metrô e trens estatais foram paralisadas. Concentrações de trabalhadores das categorias em greve e de ativistas solidários à luta foram realizadas em vários pontos da cidade:
Estação Jabaquara
Localizada no início da Linha 1 – Azul, a Estação Jabaquara é uma das mais importantes e foi 100% paralisada. Além da categoria, um forte piquete foi realizado e contou com a participação de ativistas dos movimentos sociais.
“No piquete realizamos um diálogo com a população, para explicar os motivos da greve, pontuar a necessidade de barrar a privatização do Metrô e a piora dos serviços, como ocorre nas linhas privadas, que hoje são uma desgraça”, disse Altino Prazeres, diretor do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.
Presente no piquete, junto com outros militantes do PSTU e ativistas da CSP-Conlutas, Vera (ex-candidata à presidência da República) destacou a importância da greve: “A greve mostrou a força das categorias em luta e da população, que entende que a privatização vai aumentar os preços e piorar os serviços. Foi assim com outros serviços que foram privatizados, como a energia elétrica. Não podemos aceitar que isso aconteça com água, o trem e o metrô”.
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Estação Itaquera
Trabalhadores do Metrô e das ferrovias se uniram no pátio da Estação Itaquera (Linha 2 – Vermelha) e receberam o apoio de ativistas da Zona Leste. “Viemos apoiar a greve, trazer a nossa solidariedade em nome do PSTU da Zona Leste e do Quilombo das Rosas à essa heroica greve contra as privatizações de Tarcísio”, afirmou a professora Veruska Tenório.
Camilo Martin, diretor do Sindicato dos Metroviários e militante do PSTU, agradeceu ao apoio dos movimentos sociais e ressaltou a força e a importância da paralisação. “Só a classe trabalhadora sabe o que é necessitar do serviço público. Por isso, a greve é para defender o que é nosso. O serviço público precisa melhorar. Privatização é destruição total dos serviços públicos”, destacou Camilo.
Estação Grajaú
Na Zona Sul, o movimento Luta Popular, filiado à CSP-Conlutas, e os moradores da Ocupação Jardim da União realizam uma agitação, com distribuição de panfletos à população. “É importante esse diálogo com a população para mostrar que a privatização vai levar à piora dos serviços. Que o objetivo do governador é garantir o lucro dos empresários. Ele não está preocupado com a vida do povo”, disse Silvana Garcia, moradora do Jardim da União e militante do PSTU.
Ato USP e Sabesp
“Unificou! É estudante junto com trabalhador”
Em greve, os estudantes da USP saíram em caminhada do portão 1 da universidade até a sede Sabesp, também em greve. Centenas de estudantes chegaram entoando a palavra de ordem: “Unificou! Unificou! É estudante junto com trabalhador”.
“É um exemplo de luta, essa unidade entre estudantes e trabalhadores. Nós estudantes estamos lutando contra um projeto de desmonte da universidade pública. Hoje, estamos, aqui, unidos com os trabalhadores do transporte e da Sabesp. Juntos estamos apontando um caminho para o conjunto da classe trabalhadora brasileira”, disse a estudante Mandi Coelho, do Coletivo Rebeldia e diretora do Centro Acadêmico de Letras da USP.
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A professora Flávia, coordenadora da Apeoesp-Subsede Lapa, destacou a luta contra os ataques que Tarcísio faz na Educação pública e cobrou de Lula a revogação do Novo Ensino Médio (NEM). “Temos que unir todas as categorias contra os ataques de Tarcísio que tem um projeto de desmonte e privatização dos serviços públicos. A Educação vem sendo fortemente golpeada. Esse ataque conta com a ajuda do governo Lula, que não revoga o projeto neoliberal do NEM. Dia 20, vamos paralisar a Educação em São Paulo. Era para termos unificado no dia 3, mas a direção majoritária da Apeoesp, ligada ao PT, tem feito de tudo para impedir a unidade”, denunciou Flávia, também militante do PSTU.
Entrevista
“Foi uma greve vitoriosa, forte, em unidade de três setores que prestam serviços essenciais à população”
O Opinião Socialista conversou com Narciso Soares, vice-presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo e militante do PSTU, sobre a greve unificada do dia 3; os próximos passos da luta; e sobre o plebiscito popular que está sendo realizado em todo o estado de São Paulo.
No último dia 3, a cidade de São Paulo parou com a greve unificada do Metrô, dos trens e do serviço de água, esgoto e saneamento. Qual a avaliação que você faz da greve?
Foi uma greve vitoriosa, forte, em unidade de três setores que prestam serviços essenciais à população – metrô, trem e água –, que conseguiu pautar o tema das privatizações em nível nacional e discutir qual projeto precisamos para o país. O governador quer um projeto voltado para os grandes bilionários, garantindo seus lucros, mesmo que isso signifique um prejuízo à população. Nós, um projeto onde esses serviços devam estar voltados para atender às necessidades da população, com melhor qualidade e com o controle dos trabalhadores e dos usuários. Isso obrigou o governador entrar na discussão, já que ele queria privatizar sem que houvesse barulho algum.
O governador bolsonarista Tarcísio de Freitas tentou criminalizar a greve, com a ajuda da Justiça e da imprensa. Como foi esse embate também com o governador e seus aliados?
O governador buscou criminalizar a greve chamando-a de ilegal. Também buscou criminalizar a greve dos operários da Embraer, no mesmo dia, fazendo uso da força policial e prendendo dois ativistas. Eles sempre adotam esses métodos. Fizeram isso nas nossas greves de 2013 e de 2014, e repetem agora. A resposta das categorias foi seguir com a greve, com força total e com o apoio da população, o que nos deu muita garra e impediu que o governo avançasse na política de criminalização do movimento.
Tarcísio diz que vai seguir com a política de privatizações. Qual será a resposta do movimento? Tem um calendário de lutas?
Ele diz que vai seguir com esse plano de privatizações, pois tem que atender aos seus aliados empresários, para quem ele governa, a exemplo dos grupos CCR e Ruas. O primeiro já pegou ferrovias, estradas e aeroportos, e tem por trás grandes empreiteiras, todas elas famosas por escândalos de corrupção. O Ruas domina as garagens de ônibus, através de uma grande máfia nos transportes. Mas isso que acontece em São Paulo é um projeto que está sendo implementado em todo o país, inclusive pelo governo Lula (PT), que vem avançando nas privatizações. Foi ele que assinou a privatização do Metrô de Belo Horizonte, segue com a privatização dos metrôs do Recife e de Porto Alegre. E foi a Lei das PPPs, assinada por Lula em seu primeiro governo, que facilitou esse processo de privatizações. É preciso seguir com as lutas, construir novas mobilizações e greves e unir com as demais categorias em luta.
A campanha contra as privatizações também conta com a realização de um plebiscito popular. Como está a realização do plebiscito?
Tem sido uma mobilização importante, que possibilita abrir discussões nas diversas categorias de trabalhadores, nas escolas e nas comunidades. A receptividade tem sido muito boa, já distribuímos mais de 1.500 urnas. A campanha, além de debater com a população que os serviços públicos não devem ser privatizados, lança o desafio ao governador pela realização de um plebiscito oficial, para que a população opine sobre o tema. Quem tem que decidir é a população que depende destes serviços.